domingo, 26 de fevereiro de 2012

O fato ótico

Ao olharmos telas impressionistas, pintadas em meados do século XIX, as achamos belas, líricas mas não imediatamente modernas.

No entanto, o Impressionismo traz vida, forma artística novas através de procedimentos técnicos e plásticos de pesquisa que indicariam que a Arte estava deixando de ser clássica, neo-clássica, romântica.

Os impressionistas se achavam realistas, mas a pintura às vezes chega a ser meio abstrata, tal a inundação de impressões de cores, mais importantes que os motivos pintados.

Claude Monet dizia "fato ótico" a observação do artista do motivo que ia pintar e de " pintura ótica" o resultado dessa observação, ótica, como definia. Tais conceitos, e prática, de "fato" se originam do interesse nele despertado pela recente, então, técnica fotográfica que leva o autor de impression, soleil levant à reflexão artística de uma nova percepção estética.

Ao notar a importância da luz sobre a chapa fotográfica para uma imagem ser formada, Monet, assim como outros pintores impressionistas, pensa na captação imediata da luminosidade.

A boa nova para a pintura é fazer de algo, como a luz- que até então era um elemento componente da tela- motivo plástico e temático. Era preciso perceber e pintar com instantaneidade o fato ótico e praticar uma pintura ótica.

A pintura ótica impressionista se caracteriza por não ter um tema reconhecível sendo ilustrado pela pintura, o que antes não era concebível.Como um crítico comentou, não havia um tema mas impressões. E os impressionistas achavam que estudavam a realidade...

Claude Monet não faz, de antemão, esboço desenhado do que vai ser pintado . A pintura surge da atenção do olhar que passa instantâneamente para o pincel sobre a tela. É a técnica das pinceladas rápidas, técnica que será adotada por van Gogh, Paul Gauguin, Cézanne, como veremos no post Possibilidades Novas.

A técnica de pinceladas rápidas- uma ao lado da outra formando a pintura- fica visível para o espectador numa evidência do fazer da pintura. Fazer esse que é revelação do ato da pintura como um fato. O que seria uma das características da Arte Moderna.

Claude Monet era tão interessado na captação e cognição real luminosa que pinta em vários horários telas em série tendo como motivo a Catedral de Rouen. Cada versão traz a mudança da luz e do tempo no decurso do dia.

É dada vez ao conhecimento e valor estético da percepção instantânea do motivo pintado.

Observação próxima do registro fotográfico mas ineditamente pictórica.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

novas possibilidades plásticas

van Gogh, Paul Gauguin, Cezanne, Seurat, Toulouse Lautrec aprenderão a observação do "fato ótico" com o Impressionismo, mas de modo que suscitará outras qualidades para a pintura.

1-A QUALIDADE DA AÇÃO CROMÁTICA

van Gogh usa grossas e largas pinceladas rápidas e as direciona, na tela, num sentido dramático não apenas luminoso. Soprepõe várias camadas de tintas para intensificar a pintura, e expressão, do fato ótico. Esses procedimentos dão a sua pintura consistência e expressão própria.

A percepção ótica e realização expressiva de van Gogh cria e dá forma a modo pictóricos denso e dramático, não só instantâneo mas evidência vibrante, cromática da presença vital de van Gogh.

Sua expressão vigorosa foi influente para artistas alemães nos anos iniciais do sec. XX que ficaram conhecidos como expressionistas por distorcerem a representação naturalista da realidade para expressarem-se subjetivamente.

Um pintor próximo à pintura expressionista, Kandinsky, pintava de forma em que mal avistavam-se figuras, evoluiu a pintura no sentido da abstração.

Considerado o primeiro abstracionista, numa trajetória que inclue livros, como Do espiritual na arte, o pintor de origem russo cria linhas e figuras geométricas numa concepção plástica de explosões que denotam expressões subjetivas expressionistas mas com ritmo e harmonia surpreendentes.

2- A QUALIDADADE DA RECONSTRUÇÃO DA FORMA

Outra coisa, nem impressionista nem expressiva, resulta da pintura ao ar livre, da observação do fato ótico e da fatura das pinceladas lado a lado : é a pintura de Cezanne.

Cézanne parece entender nos impressionistas mais do que impressões luminosas. Nota a mutabilidade das coisas e da Natureza.

Essa leitura de Cézanne do Impressionismo, o leva a uma apreensão cognitiva do fato ótico, diferente da captação luminosa.

Cézanne passa a procurar equilíbrios/ desequilíbrios na composição da pintura, na organização da forma dos objetos que pinta. Ele percebe os motivos que observa e procura uma forma de reconstrução que o faça compreender melhor o que está pintando.

A experiência de composição da pintura de Cézanne acentua a reconstrução de formas de modo mais complexo do que a fé e o otimismo plenos da apreensão ótica do Impressionismo.


3- A QUALIDADE DO ESPAÇO NOVO

Paul Gauguin, que deixa a Europa pelo Taiti, pintará a cor local, ambiente, e os nativos. Há uma construção de espaço novo, pois não observa a noção clássica de representação do espaço físico. O espaço na pintura de Gauguin é como achatado e formado por vários planos, partes, que se ajustam na tela. Nada é pintado ou colocado em perspectiva ou fundo infinito.

A sugestão de ambiente é direta, ótica, espacialmente pictórica, nem real nem abstrada.

Uma pintura em que soa um silêncio algo paradisíaco.


4- A QUALIDADE DO ESTUDO

Seurat


5- A QUALIDADE DO ARTIFÍCIO

Toulouse Lautrec geralmente não ocupa um lugar canônico, oficial, na arte impressionista ou pós-impressionista. Mas o pintor e gravurista que celebra a Belle Époque parisiense, lá pelos últimos anos do século XIX, tem na percepção ótica dos ambientes noturnos e feéricos da vida noturna dos cabarés um dos motivos de sua arte. Principalmente a arte dos cartazes da qual ele é um pioneiro.

Seus cartazes, principalmente o célebre cartaz Moulin Rouge, são compostos pela percepção ótica do que vê ( artistas, público, luz artificial) mas tudo é rearranjado, reencenado, digamos, para criar efeito, impacto visual no público que os olha colados nas paredes das ruas parisienses.

O espaço interior dos cabarés( as mesas, cadeiras, os músicos, os artistas, o público) é criado numa disposição que o faz cromprimir-se, como se tudo estivesse muito próxim o, tanto na cena como próximo do olhar do espectador que, nos cartazes, flagra a instantaneidade da captação da cena.

Cena estilizada, artificial que encanta, feericamente, o olhar.

Arte inesperada

Mas antes da primeira exposição impressionista ( 1874) no estúdio do fotógrafo Nadar, surge para o público (1863) o quadro de Edouard Manet chamado Olympia.

Um nu artístico de uma cortesã deitada numa cama coberta de um panejamento branco não é rejeitado simplesmente por ser considerado demasiado erótico, mas por representar o corpo, friamente pintado num tom creme, e, proporcionalmente, quase de importância menor, no espaço da pintura, do que o do destaque dado ao panejamento. Isso causa um choque, pois a representação do corpo pela pintura, e sua importância, é relativizada. Além de Olympia ser um nu nada voluptuoso ( como até então era hábito): o corpo não é modulado em seu volume.

A expressão de Olympia além da falta de volúpia, indica certa reflexão, fria, sobre a pose.

A cama e o panejamento branco, o corpo e, proporcionalmente, a cabeça diminuta estão algo inclinados na tela expondo-se quase que frontalmente ao observador. É essa frontalidade inclinada, é esse contato de uma tela mostrando a sua superfície que causa escândalo visual.

Até então, desde a Renascença, o corpo era representado, além de modulado em seu volume. com nuances tonais na representação da carnalidade.

Até então a abordagem das formas, dos temas, mantinha uma distância respeitosa do olhar do público para o motivo da pintura, o tema, como se, assim, se zelasse pela dignidade da representação das Belas Artes.

Olympia não. A tela é quase rente ao olhar, dada a ênfase conferida à frontalidade da superfície.

E a superfície da tela, e não o meio dessa ou o fundo em perpectiva, exercerá um forte papel, e terá uma função priomordial, na pesquisa plástica moderna.

Sobre a importância e o papel moderno conferidos à superfície da tela será interessante pensar-se em Matisse que ao simplificar o desenho das figuras dá ao espaço criado na superfície uma oportunidade quase inédita às áreas puras de cor, ao campo da cor que ganhará maior importância que as figuras, simpliificadas. E,também, claro, a importância da superfície para o movimento cubista, nas primeiras décadas do século XX, que trataremos no post chamado O selvagem Picasso.

O selvagem Picasso

Chamar selvagem um pintor tão conceitual como ele parece um paradoxo.

Ritmo urbano

Do espiritual na arte: a abstração

Nova visualidade para o mundo